Ali não haverá nenhum inimigo nem se perderá nenhum amigo.
— S. AGOSTINHO, “Sermão 256”
Ali, no Firmamento
OP: O Mistério que Vigiamos (4)
I
abençoa, Deus de festas
esta festa de Irmãs
à volta daquela que no amor
nos gerou para socorrer e animar
a esperança que vaciladá ao nosso corpo
e às nossas declarações de amor
braços para levantar do chão os abatidos
mãos para curar as chagas
dos que não têm asilo nem sossego nesta vidaabençoa a nossa irmã maior
na sua festa de acção de graças
guarda-a a ela e a nós
no amor e na alegria do EncontroII
Rodeados por uma nuvem de testemunhos
a que se junta a nossa irmã Teresa
nós te oferecemos o pão e o vinho
frutos do desejo, do trabalho e do perdão
que transformando este pão e este vinho
na vida dada de Jesus até ao fim
nos disponha o Espírito a caminhar
na paciência e na humildade
para cumprir no tempo a tua obra
de misericórdiaIII
nós te damos graças, Deus,
pelo mistério que vigiamos
e nos mantém de pé a caminho da Páscoa
dá o sal e a luz bastante
à nossa vida insossa e escura
dá ao nosso corpo de irmãs
o gosto da sabedoria
a palavra de fogo
que abra caminhos não andados
dá a graça fraterna da comunidade
alargada à terra e ao céu
que o teu Filho ligou
e o Espírito guarda— JOSÉ AUGUSTO MOURÃO, OP, “Teresa de Saldanha”
OP: Nos Corredores Escuros do Tempo (3)
entrai pela mão de Catarina
na cela do conhecimento de vós mesmosdescobri como sois amado
como Deus se enamorou da beleza da sua criaturadescobri o segredo da paz e das mediações
admirai o dinamismo,
a fidúcia e a heroicidade
que fizeram de Catarina pregadora insigne
pedi a liberdade de falar e de escutar
e a coragem de mergulhar
nos corredores escuros deste tempo
onde a Luz aguarda os nossos olhos— JOSÉ AUGUSTO MOURÃO, OP, “Catarina de Sena”
OP: Morada Nossa (2)
Deus, nós vimos do mar e da montanha
e nenhum lugar nos é residência
porque és tu a nossa morada,
o espaço do nosso desejo e das nossas metamorfosesuma luz nos trouxe, um caminheiro
nos deu o nome e o modo
de estar no mundo nomeando-te
de longe vimos,
antiga é a memória dos laços de famíliaguarde-nos a figura do teu anjo
não nos afogue o excesso da figura ou da visão
que leva à violência cega
que o teu anjo nos ajude
a articular, no tempo,
a palavra e o olhar que pões nas coisas,
o masculino e o feminino,
as estrelas e a areia,
o fogo e a águae dar-te-emos sempre graças,
Deus que à luz destas pedras e deste dia
nos abençoas e nos guardas— JOSÉ AUGUSTO MOURÃO, OP, “S. Domingos” (1991)
OP: Visitação dos Dias Pardos (1)
Deus, visitação dos nossos dias pardos,
palavra dos começos e do partir que não acaba,
liberta o corpo desta porção que a tua mão plantou
e Domingos regaprepara os nossos olhos para os caminhos a abrir,
liberta a nossa fala das violências do instante
e mais ainda da ruína do esquecimento,
da morte que vem só,
mais insidiosa que a violência das catástrofes;
protege as nossas diferenças,
não a indiferença que nos arrasta apáticosactiva a nossa imaginação e a nossa memória
em direcção aos horizontes que o nosso andar deslocamvisite-nos a tua claridade neste fim de dia, da vida
para que livres dos demónios das querelas,
do que nos fixa à monotonia do sono
e de todas as noites que se não esclarecem,
te dêmos em todo o tempo graças
a ti, Deus que vens em Jesus Cristo e no Espírito
e nos acordas para o país do Dia,
hoje e no tempo todo da nossa fé na esperança— JOSÉ AUGUSTO MOURÃO, OP, “S. Domingos” (1985)
Withdrawing
They withdraw from themselves, and all things withdraw along with this.
— HENRY SUSO, OP, The Little Book of Truth
Jubileu de Celebração e Renovação (OP, 1216-2016)
Tiziano, San Domenico (c. 1565).
Iniciam-se amanhã as celebrações dos 800 anos da Ordem dos Pregadores (ou Dominicana), à qual pertenço como leigo, em diversos lugares no mundo. O envio para a pregação do Evangelho é o centro da espiritualidade dominicana e por essa razão foi escolhido como tema central deste jubileu que termina a 21 de Janeiro de 2017. Não se trata de uma mera recordação da fundação da Ordem a 22 de Dezembro de 1216. O principal propósito é promover a sua renovação através da oração, da vida comunitária, e do estudo.
Santidade, Separação de Si
Dia de todos os santos, meditação sobre as vidas que as mortes não venceram, momento de uma palavra que se faz nova. A santidade é de Deus, aberta a quem com Deus se confunda. No hebraico do Antigo Testamento, a santidade encontra a sua raiz na palavra qadash, que quer dizer “separar”. Mas de quem ou do quê se separa Deus na sua santidade? Soam os alertas da exclusão. Com Jesus, percebemos essa ideia de separação desta forma: Deus separa-se de si, não se basta nem se arroga, extravasa-se, vive para fora.
Tu e Eu
Tu, Divindade eterna,
és vida
e eu sou morte.
Tu és sabedoria
e eu sou ignorância.— S. CATARINA DE SENA, OP, “Oração 10”, 14 Fev. 1379
(trad. Sérgio Dias Branco, OP, a partir da trad. para inglês de Suzanne Noffke, OP)