A Claridade (II)

19.08.2020


Passei pelo campo de futebol do bairro, mãe. Já não existe. Será que as crianças já não brincam na rua? As ervas cobrem agora a terra batida. As balizas desapareceram sem deixar vestígio. Restou apenas uma clareira, onde se pode passear sem que o sol seja filtrado pelas folhas das árvores. Tudo parece mais pequeno, mesmo este campo, esta clareira. Sou maior do que era, é certo, mas há uma escala imposta pelo tempo e pela memória. Passaram-se mais de quinze anos entre a minha visita anterior e esta, a última. Num clarão, é como se tudo fosse familiar sem que, no entanto, eu consiga retomar o meu lugar e reencontrar completamente os meus lugares. Regressei aqui sem precisar de consultar o mapa, refazendo um caminho tantas vezes percorrido que já não o consigo esquecer. Foi terrível fazê-lo há vinte anos já sem a tua companhia, mãe. Mas não preciso de o refazer para me lembrar de ti.

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“O Bosque (I)”