Bombardeamento em Bagdade a 2 de Março de 2004 (Getty Images).
Saiu hoje um artigo de P. Gonçalo Portocarrero de Almada, “Razões de um católico que vota pela vida”, no Pontos SJ que menciona o artigo que escrevi para o mesmo portal, “Razões de um católico que vota à esquerda”.
Concordo com a ideia de que não é fácil encaixar a Doutrina Social da Igreja nas categorias de esquerda e direita, da mesma maneira que considero que o “ser de esquerda” necessita de ser qualificado e complementado. Foi o que tentei também fazer. Ao mesmo tempo, noto que não recebi contestações quanto às razões económicas e sociais que apontei para votar à esquerda, como já não tinha recebido dos mais ferozes críticos da minha publicação.
O que este novo texto invoca é a prioridade à dignidade humana, em particular a posição sobre o aborto e a eutanásia. Como escrevi no meu artigo anterior para o Pontos SJ, “A presença do Ressuscitado no mundo”: “É outra tentação, das tantas que nos cercam, olharmos para a política como uma tradução das nossas convicções religiosas ou para a religião como uma tradução das nossas ideias políticas.” Havendo relações de influência entre os termos, é pernicioso para a vida plural e complexa em sociedade confundir o religioso com o político e o moral com o legal.
Portocarrero de Almada escreve que “o actual líder de um partido dito da direita, também defende a eutanásia”, referindo-se ao PSD. Parece que só resta ao “fiel coerente” votar no CDS-PP.
Podemos reflectir sobre se as políticas desse partido não empurraram muitas mulheres para a decisão difícil e lancinante de interromper uma gravidez. Podemos meditar sobre se, sendo o aborto um mal indesmentível, o aborto clandestino não é um mal ao quadrado, um mal social que exigia uma resposta política em Portugal que essa força política se escusou a dar. Mas podemos também trazer à memória que na Assembleia da República o CDS-PP rejubilou com a Invasão do Iraque em 2003, a que o Papa e a Igreja, com os bispos dos EUA em destaque, se opuseram de forma clara precisamente invocando a dignidade humana. Trata-se aliás de um partido que apoia sistematicamente uma política internacional de guerra em vez de paz, feita de intervenções militares, operações de mercenários e terroristas, sanções económicas, embargos comerciais, que tem ceifado milhões de vidas. Infelizmente, a violência devastadora da guerra agressora não é chamada para as razões de um católico que vota pela vida.
Sem o CDS-PP como possibilidade, ou ficamos sem opções, ou afirmamos que há várias opções para um católico que reflicta sobre os princípios que derivam da sua fé e vote em consciência.