O frade dominicano Herbert McCabe (1926-2001), marcante professor de Blackfriars, Universidade de Oxford, é um dos teólogos que mais nos pode ajudar a pensar sobre a condição do cristão e a sua intervenção política. Num texto penetrante sobre a relação entre a política e a virtude, ele constata que os seres humanos organizam-se em grupos, associam-se, alguns tornam-se membros de partidos políticos. Mas há “uma comunidade à qual pertencemos simplesmente em virtude de sermos humanos”, à qual não nos juntamos, a qual não constituímos: “É uma comunidade que nos constitui.” Este parece-me ser o ponto de partida que um católico deve adoptar, independentemente da sua convicção política. McCabe disse mais do que uma vez que uma coisa era a sua fé cristã, outra coisa era a sua defesa do socialismo, da necessidade de superar os conflitos entre classes sociais e a exploração humana. Isso não quer dizer que não existam laços entre uma coisa e outra que a teologia política pode explorar — como pode investigar a relação entre a fé cristã e o liberalismo ou outras ideologias. A sua insistência neste ponto é uma forma de negar uma relação intrínseca ou uma confusão entre as suas esferas que só pode descambar na instrumentalização da fé ou da política ou de ambas. Infelizmente, há mais do que um exemplo recente desta instrumentalização em Portugal. Mas além de uma instrumentalização, trata-se também um estreitamento. Ouvimos isso quando alguns padres, pouquíssimos diga-se de passagem, falam do 25 de Abril ou do 1.º de Maio como algo “deles”, ao contrário das celebrações religiosas que seriam algo “nosso”, traçando fronteiras que a vida em sociedade desmente e a doutrina social da Igreja contesta.